quinta-feira, 23 de agosto de 2007

A Canção de Amor e de Morte do Porta-Estandarte Cristovão Rilke

Cavalgar, cavalgar, cavalgar, pela noite, pelo dia, pela noite.
Cavalgar, cavalgar, cavalgar.
E a coragem tornou-se tão lassa e a saudade tão grande. Não há mais montanhas, apenas uma árvore. Nada ousa levantar-se. Cabanas estrangeiras agacham-se sequiosas à beira de fontes lamacentas. Em nenhum lugar uma torre. E sempre o mesmo aspecto. É demais, ter dois olhos. Só à noite, às vezes, pensa-se conhecer o caminho. Talvez à noite tornemos sempre a refazer a jornada que penosamente cumprimos sob o sol estrangeiro? Pode ser. O sol é pesado como, entre nós, em pleno estio. Mas foi no estio que nos despedimos. Os vestidos das mulheres brilhavam longamente sobre o verde. E agora há muito que cavalgamos. Deve ser, pois, outono. Pelo menos lá onde tristes mulheres sabem de nós.

(...)

Depois, mete a carta na túnica, no mais secreto lugar, junto à pétala de rosa. E pensa: daqui a pouco estará perfumada. E pensa: talvez um dia alguém a encontre...
E pensa: ...
Porque o inimigo está perto.

(...)

Alguém trajado de seda branca, percebe que não pode despertar; pois está desperto e perturbado com a realidade. Assim se refugia medrosamente no sonho, e permanece de pé no parque, sozinho no negro parque. E, a festa é longe. E a luz mente. E a noite o envolve, fresca. E pergunta a uma mulher que para ele se inclina:
"És tu a noite?"
Ela sorri.
Então, ele se envergonha de seu traje branco.
E quereria estar longe, sozinho, armado.
Completamente armado.

Rainer Maria Rilke

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